Comida campeã.

14 de Agosto, 2021

Comida campeã.

E se a cozinha portuguesa não for a campeã do mundo? Assim nos convida Ricardo Dias Felner a ler o artigo que escreveu para o Jornal Expresso há uma semana atrás. O leitor que respeitamos sabe que se houvesse padrinho no casamento deste blog seria certamente o Felner. Mas este texto não é sobre o mestre. É sobre a aprendiz a apregoar à sua cozinha campeã do momento. Depois de ouvir o artigo lido em voz alta por Garibaldi, empreguei-me a reflectir sobre que outras cozinhas me acalmam a necessidade de comida de conforto. E encontrei uma que defenderia de espátula em riste.

Comecemos pelo princípio - o lugar de onde todas as histórias deveriam ser obrigadas a partir -, estávamos no início de 2020 e ainda o Empório Bichara não estaria nos planos, Isabela Cordaro e Alex Miranda apresentavam ao mundo o Comunale. Garibaldi e eu, embora ainda não partilhássemos nem esta casa, nem este espaço internáutico, partilhávamos já o primeiro confinamento e a vontade de viajar gastronomicamente. Assim, encomendámos o primeiro take away da pandemia. Do que me recordo não ficámos impressionados e se ponderámos voltar talvez fosse mais pela simpatia de ambos do que pela proposta gastronómica. Mas o mundo gira e a pandemia fez de nós tripulantes de um carrossel. E com a chegada de 2021 chega, numa entrada a pés juntos, Empório Bichara: cozinha libanesa, com saltos à Síria, com sabor a avó imigrante instalada no Brasil, com memórias de um avô e de uma mercearia de onde brotava amor e inspiração (mais coisa menos coisa). Fazemos assim: a Isa e o Alex contar-vos-ão o resto da história, tim tim por tim tim, com direito a princípio, meio e fim. Vão lá e digam que fui eu que pedi.

A dupla, apelidada de cozinha itinerante, que tem sido anfitriã em diferentes espaços da cidade, instala-se agora, até o Outono começar a dar sinais, no Parque da Cidade do Porto. Temos seguido a sua itinerância e já lhes provámos um pouco de tudo. Ora escolhemos a aromática quentura dos estufados, dos arrozes de comer à colher do mesmo prato, ora testámos a aromática frescura dos molhos de cereja a acompanhar almôndegas, ora partilhámos as sobremesas em que tudo sabe a Verão num lugar por descobrir, ora repetimos o kibbeh nayyeh tantas vezes que já o sabemos escrever de cor. Tudo nos enche a boca e faz viajar mesmo a quem não quer sair do sítio. A cada novo aroma, a sensação de pertencer a um lugar que desconhecemos, de cruzar gerações e continentes.

E de cada vez que vejo a chef Isa Cordaro, confesso, é como se tivesse treze anos e me cruzasse com o “rapaz lá do liceu”. Não serei a única e saber de cor como é sentir borboletas na barriga quando se vê alguém que nos abala. Fico sem palavras, meia bamba. Quero dizer frases bonitas mas a única coisa que consigo articular é que “estava tudo muito bom”. Os mais distraídos diriam que é dos seus olhos que devoram o mundo, mas eu petrifico ao vê-la cozinhar o mundo em meio metro de cozinha. Se o verão vos trouxer até ao Porto, ou se o verão não vos levar senão perto de casa, então a viagem é aqui. O Alex receber-vos-á com o jeito de quem vos quer bem, de quem vos pode explicar como se faz pingar o soro do labneh, de quem vos quer guiar pelo que há de mais bonito. E o mais bonito, por muitas voltas de montanha russa que dê a vida, é sempre o amor.

Se a comida portuguesa estiver mal no campeonato do mundo, podemos sempre nacionalizar a Isa e o Alex porque o seu sotaque já soa a casa.

Anita