O GPS dizia 10 minutos. Tinha acabado de entrar no carro. Pousara cuidadosamente um saco atrás do meu banco e uma caixa no banco de trás. No saco uma sandes de focaccia, um hambúrguer e um rolo de canela. Na caixa, um flatbread de lingueirão tal como o que a Inês Graça partilhara no dia anterior através da página de instagram Porto Food Stories. Pões a mesa? Estou a caminho. - escrevi eu numa mensagem para Garibaldi. Lugar à porta, que sonho! Quinze minutos depois de levantar o meu take away no Cultura Que Se Come, estávamos à mesa prestes a provar o repasto.
O Cultura é seguramente um dos lugares aos quais tenho sempre vontade de ir comer mesmo sem saber o que está na carta. Sinto uma mistura entre confiança e deslumbramento, sinto o risco e a segurança e sinto que me vou surpreender e que acabo por nunca me desiludir. Às vezes sinto-me uma groupie do Cultura - dizia eu a Garibaldi enquanto dividia a meio a sandes de focaccia. Desta vez, a ida ao Cultura foi pura inveja da fotografia da Inês e profunda curiosidade pelo flatbread de lingueirão. No entanto, o que arrasou mesmo comigo foi a focaccia de lula frita, piso de coentros, pickles de funcho e uma maionese de alho assado, lima e tinta de lula. No instante da primeira dentada, regressei de imediato à sensação que uma vez tentara descrever ao Chef Tiago Sousa aquando da minha segunda visita ao Cultura. Isto é muito português e, ao mesmo tempo, faz-me sentir de imediato noutro lugar do mundo - disse-lhe. Os produtos e os paladares são tão portugueses como esta Anita que aqui ledes. Talvez sejam as técnicas, a visão e a experiência desta equipa liderada por Tiago Sousa e João Magalhães, que fazem de qualquer prato uma viagem sem fronteiras.
Chegou a vez do Flatbread. Nem eu nem Garibaldi, por muito fãs que sejamos, esperávamos o arrebatamento deste prato. Cada ingrediente era capaz de sobressair no tempo certo, de se fazer notar com a intensidade e o equilíbrio perfeitos. Um pão fofo, suave, a desfazer-se contra o céu da boca. Uma cebolada caramelizada contrastando doçura e acidez. Um molho branco que denunciava a profundidade do sabor a lingueirão. Verde em toda a superfície, ervilhas de quebrar e acelgas, cruas e boas, mesmo no seu tempo, mesmo no seu ponto. A cada dentada um pedaço de lingueirão, como um pedaço de mar que nos mergulha na boca. Mais uma trinca, mais outra até não sobrar nenhuma, nem um dedo por lamber.
Por esta altura, qualquer comum mortal já teria cruzado os talheres. Mas lembrar-se-ão do hambúrguer, certo? Com o olhar de fita métrica e de faca na mão, dividi o dito em partes eximiamente iguais. Brioche, cheddar, carne, maionese de sriracha, kimchi e salsa macha. Suculento, guloso, intenso, picante, explosivo e audaz.
Adorava contar-vos que não sobrou espaço para a sobremesa. Mas nós sabemos bem que a sobremesa é servida num estômago à parte. Café, meio rolo de canela e muita coragem. Principalmente para mim que a seguir fui trabalhar como gente grande.
Anita