-Vamos ao restaurante do Chef Tiago Feio e da sua companheira Cátia Roldão.
Companheira? Outra vez. Os homens em primeiro lugar e as mulheres no lugar de sempre. Companheiras, ajudantes, criadas. Já estou chateada e a perder a fome. Se calhar estou a exagerar. Só estou mesmo chateada. A fome aumenta-me com os nervos e a promessa de um jantar exclusivo quase me distrai. Penso: pode ser que te surpreendas. Estou a chegar à porta e já só quero saber dela. Já só quero vê-la, ouvi-la, dizer-lhe que ela não é companheira de ninguém.
Entro e é ela que me recebe. Os óculos embaciados, a respiração ofegante e ele ao fundo. Pergunto-lhe sem a conhecer:
Estás mais nervosa ou mais serena?
Ela responde sem me conhecer:
Estou mais nervosa.
Despontava o Outono de 2020 e o TiaTia preparava-se para abrir portas na Rua Mártires da Liberdade. Nós, comensais estudiosos da escrita e da gastronomia, avançávamos escada acima sem adivinharmos a intimidade e a viagem enogastronómica que haveríamos de experimentar.
Digo-lhe que vai correr tudo bem e sento-me. Ela apresenta-se, apresenta o projeto, apresenta os vinhos. Ele fala de vez em quando e serve-nos. Ele é Chef. Ela é tudo. Ela protagonista, ela visível, ela no comando. Já não estou chateada nem a perder a fome, estou a devorar tudo. O exotismo de um prato de marmelo, abóbora, côco e coentros, a acompanhar um Eremitas Antão do Deserto 2017 de Mateus Nicolau de Almeida, crava-se algures entre o meu coração e o meu palato.
No Tia Tia, os vinhos, que são sempre o par, aqui são o centro. A comida, que é sempre o centro, aqui vem para acompanhar. Como ele e como ela. Ao contrário de como é sempre e tudo no lugar certo.
Anita
Nota: Neste momento o TiaTia não está aberto ao público mas pode ir até vossa casa através do Oba Oba (TiaTia at Home)